Vale Tudo: 34 anos de um sucesso mais atual do que nunca



AVISO IMPORTANTE: O texto trata exclusivamente de uma análise atemporal da novela feita sob contexto de época. NÃO HÁ conotação política de nenhuma natureza.



 Há 70 anos, famílias inteiras de brasileiros se acostumaram a sentar em frente à televisão todas as noites para acompanhar as novelas.
Durante um período de seis a oito meses, o público se envolve no enredo elegendo seu herói, seu vilão e seu casal preferido. 
E algumas vezes bancam o agente secreto na solução de um mistério que move, conduz e até mesmo salva a trama como por exemplo, o clássico quem matou personagem tal. 
O autor joga pistas que durante o desenrolar do mistério são minuciosamente analisadas de um outro ponto de vista para fornecer aos personagens evolvidos e ao público o raciocínio para resolver esse mistério que muitas vezes  paralisa um país inteiro em frente á TV e tanto a investigação quanto o desfecho causam mais impacto até do que qualquer fato da vida real.
Ainda conservo esse hábito e não só assisto novelas da maneira tradicional (brasileira, produzida e exibida pela Globo) como também já assisti em outras emissoras, novelas produzidas em outros países como México e Turquia - dubladas, obviamente - e também por streaming. 
Pretendo em breve me aventurar por tramas vindas de outras culturas que ainda não conheço bem. Basta que seja uma estória atraente e boa que me prenda desde o começo do primeiro capítulo. 
Tenho uma teoria: As novelas são como livros "com imagens" em que todos "leem juntos" até o final. Isso, claro, antes do advento dos streamings que revolucionaram com a ideia de que a partir de um catálogo variado como se fosse uma locadora de vídeos  os conteúdos são disponibilizados  para que o público escolha o que quer assistir e ele próprio controle a exibição  de maneira totalmente conveniente ao tempo que dispõe para acompanhar o programa escolhido, inclusive assistindo vários episódios consecutivos em forma de maratona. 
Bem, como todo noveleiro, também tenho as novelas que são minhas preferidas. 
Dentre elas há uma que gostei muito e sempre assisto quando há reprise na TV. E que, apesar de tanto tempo de exibição, poderia tranquilamente ser gravada e exibida hoje em dia pois ainda continua atualíssima. 
Quem não se lembra de Vale Tudo de Gilberto Braga? Quem viveu no Brasil a época entre Maio de 1988 e Janeiro de 1989 com algum grau de percepção de mundo, pelo menos ouviu falar nesta novela de sucesso.
O embate entre a mãe Raquel Acioly e a filha Maria de Fátima, (Regina Duarte e Glória Pires respectivamente) deixavam claro que, enquanto uma era honesta e trabalhadora, a outra usava de meios escusos para subir na vida a qualquer custo, inclusive chegar ao ponto de vender a casa na qual morava em Foz do Iguaçu com o objetivo de ir para o Rio de Janeiro, fazer de tudo para arrumar um marido rico e ter a boa vida que sempre quis. O alvo em questão era Afonso Almeida Roitiman (Cássio Gabus Mendes), filho da poderosíssima empresária do ramo da aviação Odete Almeida Roitiman (Beatriz Segall). 
Através desse conflito entre as personagens, Gilberto Braga nos propõe a seguinte pergunta para a reflexão: Realmente vale tudo para se dar bem na vida? E ali, a cada capítulo víamos não só Fatima se dando bem com seus golpes e trambiques mas também outros personagens que, em maior ou menor grau praticavam o famoso "jeitinho brasileiro" para conseguir alguma coisa ou alguma posição. 
É uma mistura de sentimentos ambíguos quando às vezes nos pegamos torcendo pelos vilões que sabemos que não são corretos mas são simpáticos e não parecem ser o que são, sem escrúpulos e frios.  
Personagens como Marco Aurélio (Reginaldo Farias), Olavo Jardim (Paulo Reis), Solange Duprat (Lidia Brondi), Renato Filipelli (Adriano Reis), Eugênio (Sergio Mamberti), Heleninha Roitiman (Renata Sorrah), Celina Junqueira (Natália Thimberg) Aldeíde Candeias (Lília Cabral), Tiago Roitiman (Fábio Villaverde), Jarbas (Stephan Nercessian), Ivan Meirelles (Antônio Fagundes), Freitas (João Camargo), Consuelo (Rosane Gofman) e muitos outros são o motor deste clássico de sucesso. 
Cada um ali tem seu pedacinho importante na trama que traz também uma ousada discussão de forma bastante velada: O homossexualismo feminino e a união homo afetiva entre as "amigas" Laís (Cristina Prochaska) e Cecília (Lala Dehinzelin) além da crítica nada velada ao país feita por Odete Roitiman que tem muita coisa de exagero mas também algumas verdades. 
Odete também coleciona muitos desafetos na novela e isto faz dela o personagem principal de um mistério: Quem seria seu assassino?
Quem matou Odete Roitiman foi a pergunta mais recorrente em rodas de conversas, apostas, concursos por todo o Brasil nos capítulos finais de Vale Tudo. 
Mistério guardado até o último instante que nem mesmo os atores e diretores conheciam a identidade do assassino antes da gravação da cena em que tudo é revelado, momentos antes de ir ao ar (quem estiver lendo este blog agora e tiver mais de 40 anos já sabe quem é o assassino porém, em respeito ao público que esteja assistindo via streaming ou por qualquer meio pela primeira vez, me comprometo a não passar spoiller e a censurar comentários com spoillers) .
Gilberto Braga desenrola no melhor estilo Agatha Christie esse mistério fornecendo as pistas de forma eficiente e hábil.
Desconheço se ele leu algum livro da grande "Rainha do Crime" ou de qualquer outro escritor que possua esse estilo. Acredito que sim pois o mistério de Vale Tudo poderia muito bem caber numa obra destas.
A novela também teve o lado social abordando o alcoolismo de Heleninha e mostrando ao grande público o trabalho realizado pelo A.A. (Alcoólicos Anônimos) e o A.L.A.N.O,N. (uma rede de apoio a familiares e amigos das pessoas que sofrem com o alcoolismo).
Lançou moda e bordões inesquecíveis.
Deu muito trabalho para emissoras concorrentes que tiveram de lançar mão de muita criatividade e jogo de cintura para obter a audiência do público fiel de Vale Tudo.
Uma fórmula que primeiro resultou em um grande sucesso e depois em um clássico. 
Uma das novelas mais lembradas até hoje sendo referência para muitas que seguem a mesma linha de enredo. 
Tem seu público fiel que depois de assistir a edição original também prestigiou todas as reprises, ou a maioria delas, como eu por exemplo que terminei hoje a minha quarta exibição (via Globoplay). E já estou com saudades, sabem como é...
Existem boatos de que a TV Globo vai reprisar mais uma vez no Vale A Pena Ver De Novo, sessão vespertina de novelas de sucesso que ganham uma nova edição para serem readequadas ao horário. 
Esta nova reprise, se confirmada, seria como uma homenagem ao autor Gilberto Braga que faleceu recentemente  
A emissora nem confirma nem desmente. 
Enquanto isso é só aguardar os "próximos capítulos" e quem sabe  assistir pela quinta vez.

 

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